sexta-feira, 8 de outubro de 2010

ESBOÇO DE UMA ANÁLISE DA POESIA DE SANTO SOUZA



A análise de A construção do espanto (1998) pode ser dividida como a própria divisão do texto feita pelo autor.
1 – Nos portões do abismo
É nesse trecho inicial que o autor exprime o sentimento de angústia da limitação humana frente aos limites impostos pela linguagem e pelo conhecimento do inacessível.
Mas resta a esfinge. E a nossa angústia, ao ver
a porta sempre aberta à ventania
da eterna indagação do acontecer
na treva indevassável, a agonia
ante o enigma maior – ser ou não ser,
com que a argúcia de Deus nos angustia.
(Souza,1998,p.14)
A esfinge representa o que há de misterioso ou o que precisa ser descoberto para a jornada órfica ser continuada. A angústia é sentida quando o enigma é proposto e só é dissipado quando resolvido; a esfinge atira-se no precipício. É o ritual de iniciação em que o poeta Santo Souza propõe no início do livro: vencer a esfinge em seu enigma. Contudo, ao vencer a esfinge é Orfeu ou os mistérios órficos que entram em cena:
E após abrir os portões do abismo,
Orfeu penetra seu falo de luz
No escuro de seu ventre, ó noite...
(Ibidem,p.15)
2 – Noite inaugural
O poeta sergipano inicia essa segunda parte do poema fazendo uma crítica à civilização que roubou a beleza natural das coisas, porém dois símbolos utilizados chamam atenção pela sua recorrência em obras anteriores. O primeiro é a rosa, cujo simbolismo remete a pureza inicial da palavra, ou seja, o iniciado deve cultivar a palavra para que não perca o frescor e exale o perfume do jardim do poeta. O segundo símbolo é o do espelho – essa referencia simbólica é bastante importante para a construção do imaginário poético de Santo Souza. O espelho precisa estar intacto, como a rosa, para que a tentativa de enxergar o reflexo do real possa ser mais nítida. A imagem projetada no espelho é uma imagem invertida do real, mas ela serve como referência mais próxima, por isso necessita estar límpido. O espelho quebrado representa o rompimento com a tradição que precisa ser refeito:
Partiram-nos o espelho, e o imediato
trabalho que nos resta é recompô-lo,
reter-lhe a simetria em nossas mãos,
dar-lhe contorno, luz e densidade,
subtraí-lo da noite e penetrar
sem medo e ousadamente em seu reflexo,
para arrancar de dentro nossas faces,
nossos olhos insones, nossos mortos,
o som das nossas músicas antigas...
(Ibidem,p.25)
A interpretação desse símbolo – espelho – tem como base a psicologia. Ela cita Karl Sheibe e apresenta três propriedades simbólicas:
I. Refletir e registrar informações; uma maneira de produzir conhecimeto.
II. Gerar autoconhecimento, pois o indivíduo se enxerga nele.
III. Refletir a história da humanidade; reflete o passado.

Recompor o espelho, então, significa também reconquistar essa perda: o conhecimento do mundo, o de si mesmo e o da história. .

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